Cuidados em Anestesia | Pandemia COVID-19

A) Cuidados perioperatórios em doentes com baixa probabilidade de terem COVID 19.

  1. Em procedimentos de elevado risco de aerossolização, como entubação traqueal, traqueostomia, colocação de sonda nasogástrica, aspiração de secreções da orofaringe, deve ser utilizado material de proteção pessoal com respirador FFP2 ou N95 com viseira ou em alternativa óculos de proteção e luvas.
  2. Verifcar a correta selagem da máscara.

Deve ser considerado em todos os doentes : 

  1. Pré-oxigenação sem pressão positiva, com boa selagem da máscara facial.
  2. Entubação de sequência rápida
  3. Utilização de uma luva para envolver a lâmina de laringoscópio  imediatamente após  a sua utilização ( técnica de degloving)
  4. Minimizar as desconexões do ventilador. Utilizar um clamp caso seja necessário efectuar a desconexão.
  5. Considerar, caso não exista contra-indicação, extubação profunda com selagem adequada da máscara facial. Ponderar  fármacos que reduzam a reactividade brônquica.

Pós-operatório : 

  1. Quando o doente estiver bem acordado deve ser colocada máscara cirúrgica. Em caso de necessidade, pode ser colocada oxigenoterapia por cânula nasal sob a máscara facial.

B) Abordagem perioperatória do doente com elevada probabilidade de COVID 19 ou COVID 19 positivos.

Discutir risco / beneficio de cirurgia eletiva no contexto atual. Neste momento, todas as cirurgias consideradas eletivas serão adiadas.  

Em todas as outras situações, o risco / benefício deve ser ponderado, tendo em conta o pior outcome nos seguintes grupos de risco: doentes idosos, imunodeprimidos (não esquecer doentes sob corticoterapia), doentes diabéticos, com patologia cardíaca  ou respiratória.

Pré-operatório

Checklist para estratificação de risco:

– Confirmar junto do doente e  dos profissionais de saúde:

  • Sem queixas (febre, tosse, dispneia, sintomatologia característica de infeção respiratória alta)
  • Ausência de hx de contacto ou exposição com doentes suspeitos ou com COVID19
  • Ausência de viagem nos últimos 15 dias para locais com elevada prevalência de COVID 19.

Intra-operatório 

– Preparação de sala:

  • Equipamento de proteção individual (EPI) de acordo com o vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=5x6FS2_jRm8
  • Necessidade de 2 elementos, sendo que um supervisiona  a colocação do EPI do outro.  (double-checking)
  • A necessidade de supervisão estende-se até à retirada do equipamento .

Constituição de material de proteção individual

  • Proteção de calçado universal
  • Fato de proteção integral resistente a fluídos.
  • Mascara FFP2
  • Viseira
  • Touca
  • 2 pares de luvas

Sala de bloco previamente selecionada para estes casos
(a escolha deve ter em atenção os seguintes aspetos)

  • Criação de um circuito próprio no bloco de “sujos” / “limpos”
  • Minimização do percurso do doente no bloco operatório
  • Sala com 2 entradas distintas
  • Preparação da sala com todo material necessário à cirurgia (evitar saídas desnecessárias). Retirar todo o material que não seja necessário.
  • Deve estar disponível um profissional no exterior da sala para a necessidade de fármacos / equipamento / realização de gasimetrias. Estes devem ser colocados num tabuleiro e deixados no exterior do sala, sem nunca haver contacto direto com esse profissional.
  • Disponibilizar soluções alcoólicas tanto no exterior como no interior da sala


Proceder à desinfeção imediata das superfícies de passagem do doente. 


Aspectos específicos da anestesia

Equipamento relacionado com máquina de anestesia 

  • Verificar a presença de filtro HEPA  de elevada eficiência  no ramo expiratório e filtro HME  no ramo inspiratório do circuito, junto ao doente.
  • Trocar cal sodada , circuito respiratório e filtros no final de cada procedimento.
  • Material de utilização de abordagem da via áerea , preferencialmente descartável.

Técnica locorregional – Técnica preferencial.   
O doente deve utilizar máscara durante o procedimento cirúrgico e recobro, mesmo que exista necessidade de oxigénio suplementar. A cânula nasal deve ser colocada por baixo da máscara facial.

Entubação e extubação 
idealmente em ambientes sem pressão positiva (momento crítico – manipulação da via aérea pelo risco de aerossolização ). Estes procedimentos devem ser efectuados com o menor número de profissionais no interior da sala.

Evitar dispositivos supra-glóticos ou ventilação não invasiva (CPAP/BIPAP)

Método preferencial para entubação / extubação

  • Videolaringoscopia com lâminas descartáveis (mesmo em situação de VAD).
  • Evitar fibroscopia e aerossolização de anestésicos locais.
  • Na indução anestésica, evitar ventilação manual ou , se necessário, ventilação com baixo volume . Em caso de ventilação manual ,considerar ventilação a 4 mãos, com recurso ao enfermeiro de anestesia, para selagem mais eficaz.
  • Só iniciar ventilação positiva, após confirmação de selagem efectiva do cuff. (medição da pressão do cuff)
  • Após entubação, envolver o laringoscópio com a luva de forma a evitar aerossolização de material .
  • Em acaso de necessidade de desconexão do circuito, clampar o tubo orotraqueal.
  • Considerar extubação profunda se não for contra-indicada (menor dispersão de gotículas)
  • Necessidade de equipamento de sistema de aspiração fechado
  • Se técnica locorregional, o doente deve utilizar máscara durante o procedimento cirúrgico e recobro.

Pós-operatório 

  • Recobro deve ser efetuado na sala com 2 elementos (não transportar para a UCPA).
  • No final, retirar EPI na sala exceto máscara de FFP2. Esta deve ser retirada imediatamente após saída da sala, juntamente com o par de luvas ( colocadas no recipiente próprio ).
  • Desinfeção das mãos com solução alcoólica no final do procedimento.
  • Proceder a descontaminação de todas as superfícies, máquina de anestesia , cabos , monitores, teclados.
  • Planeamento dos casos deve ter um intervalo de pelo menos uma hora .
  • Em situações de confirmação COVID19 deve ser efectuada uma vaporização com peróxido de hidrogénio.  (descontaminação mais eficaz do bloco).
  • Deve ser efectuado a registo dos profissionais envolvidos

C) Abordagem da via aérea em contexto de urgência doente com suspeita de COVID19

Entubação endotraqueal associa-se a risco elevado de aerossolização de partículas, devem ser utilizadas todas as estratégias de minimização da transmissão a profissionais de saúde.

  1. Planear a entubação
  2. Verificar o funcionamento de todo o material: laringoscópio descartável, monitor, ventilador, fármacos,  sistema de aspiração.
  3. Verificar a presença de filtro de alta eficiência entre as traqueias e a máscara.
  4. Necessidade de 2 profissionais devidamente equipados com o material de proteção individual.   Aconselhada a colocação de 2 pares de luvas . (par de luvas exterior deverá ser de cano longo) Idealmente entubação em quarto de pressão negativa.Em alternativa,   na Unidade de Cuidados Intensivos.   https://www.youtube.com/watch?v=5x6FS2_jRm8
  5. Deve ser realizada pela pessoa mais experiente.
  6. Pre-oxigenação durante 5 minutos  com selagem completa da máscara facial e técnica de entubação de sequência rápida  –  Dose de rocurónio  – 1.2 mg/kg.   –   (Assegurar relaxamento muscular profundo para evitar tosse).
  7. Imediatamente após sua utilização, colocar laringoscópio em luva.
  8. Confirmação da entubação, deve ser realizada através de capnografia .
  9. Em caso de situações de grande quantidade de secreções utilizar um sistema de aspiração fechado.
  10. Retirar material de proteção individual de acordo com o vídeo, acima referido.

ATENÇÃO: Risco elevado de auto-contaminação na retirada do material.  

Grupo de trabalho
Dr. João Sá Peixoto | Dr. Pedro Branca | Dr.ª Rita Moutinho | Dr.ª Luísa Ferraz | Dr. João Carlos Mota

Bibliografia
– Normas 002 /2020, 003/2020 e 006/2020 Infeção por SARS-COv2. Direção Geral de Saúde.
– Recomendações do colégio de especialidade de Anestesiologia sobre o COVID-19. Março 2020.
– Coronavirus (2019-nCov-2), Information for Health Care professionals  – Recommendations, American Society of Anesthesiologists.
– Guia de actuación frente a SARS-Cov-2. Servicio de Anestesiologia, Cuidados Intensivos de Anestesia e Tratamento del dolor. Grupo de trabajo de Seguridad em Anestesiologia .Hospital Univesitário . Actualziado a 7 de Março de 2020.

Recomendações da Sociedade Portuguesa de Cuidados Intensivos para abordagem do COVID-19 em Medicina Intensiva.  Sociedade Portuguesa de Cuidados Intensivos . Março 2020 .

www.spci.pt

Serviço de Anestesiologia – Recomendações para a abordagem da via aérea em doente com suspeita de infeção por coronavírus (2019-ncov). Serviço de Anestessiologia do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte EPE. Março 2020.